segunda-feira, 12 de outubro de 2009

TINO COMERCIAL

Tino Comercial

Doca Ramos Mello

Faz tempo que a Vergonha na Cara abandonou não só a cara, mas também a cabeça, tronco, membros, atitudes, bolsos, conversas e a biografia dos senhores políticos da terra de Rui Barbosa que, com a graças de Deus, está sepultado e livre de ter de se pronunciar novamente contra o fato de ver prosperar a desonra... Etc.
Em todo caso, o senador Oquifio Dumaégua da Silva, fundador do PPV – Partido Puta Veia (a tal reforma da língua só serve para quem escreve ter de se explicar a toda hora, ô inferno, esse “veia” é de “véia”, ou seja “velha”; puta velha, no popular), conhecido pela transparência com que conduz seu cargo, sem ocultar uma única das mutretas de que participa, está pelas tampas com a questão dos fichas sujas.
“Acho isso tudo uma sacanagem. Se for exigir ficha limpa, limpa, no cacau, branco no branco, quá quá, quá, aposto que 90% dos candidatos vão p’ro brejo e acaba que não teremos gente suficiente para assumir os cargos, ora. Até porque quem está no baile sabe que essa gentinha honesta e chata que ainda sobrevive parcamente por aí, rareia na mesma medida em que se ofende se convidada a fazer uma filiação partidária! Experimente chegar para um cidadão de bem (credo!), desses respeitados pela conduta, pelo dinheiro ganho com suor e honestidade, pelo respeito que têm pela família, os amigos, a sociedade, gente que paga as contas regularmente, não rouba e cumpre compromissos, blá, blá, blá... Pois experimente convidar um bocó desses para se candidatar a vereador que seja e ele vai fazer um escândalo no ato: ‘Está me estranhando, acha que sou ordinário, é isso?!’ O povo fica puto.”
Diante dessas considerações, Dumaégua da Silva tem uma solução que, segundo ele, vai resolver a questão da ficha suja para os políticos. “A minha ideia é fazer todo mundo feliz, basta raciocinar politicamente com um olho no cravo e outro, na ferradura, é elementar. Seguinte: como é que nós, políticos, limpamos o dinheiro que extraímos dos lombos do povo que trabalha e paga impostos para nos sustentar as mordomias, a vida de abastança, amantes, bebidas finas, jóias, fazendas, empresas, castelos, aviões, enfim, esses pequenos luxos de que necessitamos para gozar os mandatos? Lavando a grana, pessoal. Simples assim, ora essa”.
Dumaégua da Silva diz que, da mesma forma usada para lavar a dinheirama roubada ao povo, deve o político alvejar sua ficha. Como? Primeiro, negando veementemente, sempre com lágrimas nos olhos – vale invocar mãe, filhos, avó paralítica. Segundo, processando os acusadores e pedindo indenizações de peso por calúnia, difamação e danos à imagem. Terceiro, com bons advogados caríssimos e marqueteiros, pagos com o dinheiro do povo mesmo. E criatividade, nariz em pé, encenação, contatos, amigos de fé e tretas, penetração na Justiça, arranjos, conluios, algumas ameaças, claro, e muitos outros itens manobráveis com facilidade. “A ficha fica límpida como água de riacho intocado, uma alma de bebê!”
Para agilizar tais providências, ele acaba de montar em Brasília a Lavanderia Dumaégua Dois em Um PPV, projeto que oferece o Pacote 100% Limpeza, com a finalidade de lavar, enxaguar, secar, perfumar e embelezar, de uma só chacoalhada, a grana ilícita e também a ficha suja do candidato, em caso de reeleição. Para os novatos interessados em entrar na boca com a mesma cara de pau, a lavagem só inclui a ficha suja, inicialmente, mas o cliente pode deixar apalavrado e assinado contrato para que no futuro próximo a empresa lhe assegure sossego total, tão logo comece a entrar dinheiro grosso em seu bolso ou nas Ilhas Caimã.
“Vamos fazer um arrastão de limpeza na vida e na obra de todos aqueles que vierem para o Puta Veia, ‘xa comigo. Denúncias, condenações, acusações, dinheiro em paraíso fiscal, fotos e vídeos de negociatas, quadrilha montada, o diabo, a gente vai lavar bonitinho, deixar branco Omo, sem que o candidato perca tempo com isso. Ou seja, a Dois em Um cuida do branqueamento, temos até assessor de imprensa e de imagem, gente nossa nos tribunais, tudo, tudo! Em caso de xilindró em curso, como o do Hildebrando Pascoal, vamos apelar para a vigência da exceção, do absurdo, e dar um trato legal na ficha que ficou preta, uma vigorosa enxaguada no prontuário e um chega p’ra lá em quem se meter a besta, coisa que acabo de aprender melhor com o dono do Maranhão. Pronto. Tipo assim, a Lavanderia arruma um Quase Indigente para pagar a conta, ou seja, ser apontado como mandante do crime, desviador do dinheiro ou outra coisa qualquer como inimigo da democracia, zelite, sei lá. Essa particularidade nem vem ao caso”.
Grana limpinha, ficha lavadinha: Lavanderia Dumaégua Dois em Um PPV, eis a peça publicitária do negócio. E se apropriando com a cara lavada de slogan alheio, o marketing diz ainda “Vem p’ro Puta Veia você também, vem!”
Fazendo uso da música da marchinha carnavalesca “Cachaça não é água”, com letra de Sarney e Jader, eis o jingle da Lavanderia, na voz de Agaciel Maia, com Palocci na bateria, Zédirceu na cuíca, Maluf no agogô, Lady Dil na performance e milhares de políticos no ‘backing vocal’.

Você pensa que minha ficha é suja
Minha ficha não é suja, não
O PPV deixou limpinha
Também lavou meu dinheirão

Pode me faltar vergonha
Honestidade, decência ,afeição
Pode me faltar a ética
Essa merda toda não faz falta, não

Pode me faltar dignidade
Isso eu até acho graça
Só não pode me faltar
A delícia da trapaça

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